28 de jan. de 2006

Meu Amor vive de brisa


Vista de Resende, originally uploaded by marciamaia.

Flagrei o Minotauro vasculhando as gavetas da escrivaninha. Cínthia, vamos estudar mandarim. É a única solução que antevejo, salvo as paredes de correntes penduradas. E ainda me perguntam, se as marcas são de chicote. Chicotinho queimado, tesouro. Vuuuuuuu... Te mostrei a tatuagem? Na pélvis estava escrito: Bruno Fornazze. Nem quando os pêlos crescerem, será coberto o vislumbre do inferno. Eita, grutinha, quente da porra. Você não ia fazer no cofrinho? O Naz preferiu na frente. Melhor do que piercing. Ela aceitou contrariada. Ele se apropriara do corpo da Cinthia, mas a alma era de Deus; enquanto estiver eu por perto, alimentado sua mente com palavras. Ah! Marcinho você é tão inteligente. Já lhe disse, se eu fosse inteligente estaria em Salamanca, observando os patinhos correrem atrás da mamãe deles? Como é mesmo aquela palavra? Ensimesmado. O telefone interrompera nosso chá. Atendi. Sete palavrões para me convencer da estima que sentia por mim. Eu te amo, declarou-me o sumo pontífice. Papá. Papa. Papão. Atendia como eu bem lhe chamasse. Naz, ela está no banho. Ele pediu-nos que estivessemos no restaurante às nove horas . Passeio completo. Chegamos 10 minutos atrasados. O maitre nos recebeu sorrindo. Encontraram um fuzil que só ele sabia desmontar, levantou-se e saiu. Deixou a garrafa pela metade. Eram sempre as mesmas histórias. Se o celular tocasse, podia ser no meio da trepada, ele vestia a calça, arrancava as meias pretas de dentro do sapato, calçavá-los e saia abotoando a camisa azul. Sempre a mesma. Amante de rituais. Começa de baixo para cima para não se peder. Do dedão-do-pé à orelha. Do calcanhar à nuca. Nossos pés, segurados com as mãos, como se fosse possível fundi-los. Eu relutava. A Cinthia se submetia. De cabeça para baixo havia poucas rotas de fuga. E cade a sua? Você vai pagar?... Fala lá com o Montalvão. ...pelo centímetro quadrado da minha pele. Bota preço. Não estou à venda. Como não queria ser estripado, antes de ser arremeçado contra o espelho, disse-lhe que para ele seria de graça. Além de irritar, o que você quer? -- me perguntou, acariciando-me o pescoço. Devagar, murmurei. Dentro da Cínthia havia um néctar diferente. Cheirava à brócolis. Na posição que me encontrava, me convenci que ele tinha razão em controlar nosso quotidiano, mesmo que para isso espionasse nossa privacidade e pusesse estranhos para nos seguir, nos observar. Sim. Eu tenho um diário, no qual você é o antagonista da minha história. Sinta-se privilegiado. Só me lembro de quem amo, no momento em que estou escrevendo. Seu hálito me refresca. Já tomou cialis? Disseram que só de soprar a brisa... Quando estou saltando a 9.000 pés de altura (acreditava em tudo que ele dizia; a Cinthia, não.), penso na gente, no que iremos inventar na próxima vez que nos encontrarmos; ouço, mentalmente, seus gritos, os gemidos da Cínthia. Só há uma sensação melhor do que saltar de pau duro. Ele me beijou. Afastei-lo ao me levantar. Que aconteceu? Nada, Cínthia. Só não estou com paciência para ficar dando atenção a gente bêbada. Não sei como você agüenta o hálito dele. Perfume dos trópicos, me dissera uma vez. Aquilo foi no início.

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