29 de nov. de 2005

Por enquanto, não consigo mastigar, mas consigo escrever. Ler me distrai do pós-operatório. Medo. "Os Irmãos Karamazovi" ficou esquecido sobre a cama, emaranhado no edredon cor-de-rosa. Alessandra, Alesandra, Alessandra. Tenta relaxar, Marcinho, não cai uma agulha, sem que Deus saiba. Podia detalhar o sexo, ansiolítico natural, mas prefiro falar dos cirurgiões, da assistente. O desconto funciona mesmo? Funciona, sim. Consegui pensar rápido antes da anestesia. Cinco por cento. Já é alguma coisa. Imagine se fosse um aumento de cinco por cento na taxa selic? Eles riram. Me senti do povo. Deixei a sala de cirurgia sem esclarecer minhas dúvidas. Não era capaz nem de responder as perguntas. Até ali, tranqüilo. Vamos embora. Tchau, Senhor Doutor, Senhora Doutora e Senhora Assistente. Obrigado. Fiquem com Deus. Ainda não chove. É uma bênção. Tenho me agarrado a Ele, prometido fazer a lição sem queixas ou reclamações. Tem que fazer, não tem? Então faça. Não posso mais protelar. Pude ouvir o osso sendo raspado. A Assistente me fazendo cócegas com suas histórias de identidade dobrada dentro do bolso da calça. Senhora, cuidado! Eu sou escritor, tenho um blog. Suas falas podem virar literatura nas minhas mãos. (Ih! começou a pretensão.) Todos rindo e eu sentindo um alívio. Se estão rindo, é porque não está havendo complicações. E se eles forem sádicos? Papai do céu, nos havíamos conversado que nunca mais nos envolveríamos com esses tipos, por mais ricos, belos e charmosos que fossem. E pensar que por causa de um perverso, estava sendo aberto e costurado. Espero a Alessandra me ligar. Esqueci meu livro em cima da cama. Eu sei, eu sei. À noite, eu te levo. E quem me faria companhia, enquando chove? Beatriz. Sob efeito do Paraíso que faltava. Sim. O Paraíso de Dante. Anestésico natural. Tanto que acabei de escapar de um assalto. A cidade torna-se fisicamente violenta, mas do que a Ética permite.

2 comentários:

  1. Anônimo4:06 PM

    Olá
    Vi você no blog de um amigo que tivemos em comum, o Palhaço Bocudo. Li seu blog e adorei seus textos. Ainda estou chocada com a ida prematura e tão inesperada do Bocudo. Triste mesmo. Infelizmente, é a vida. Ou melhor, a morte. Que o pegou rapidamente, sem dar tempo de dizer adeus... Um abraço pra você. Visite-me!

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  2. Anônimo10:45 AM

    não quero pensar em tirar os cisos. tenho tanto medo disso quanto tenho medo da luz. essa, que me (des)cobre. Abs.

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